Se tem uma coisa que me dá um sentimento misto de fetiche e desconforto (masoquismo?) é a forma como a mídia, principalmente a brasileira, absorve as tendências da juventude-mocidade criando rótulos automáticos que possam simbolizar um possível hype* em ascensão. Esse cacoete midiático se tornou tão onipresente na nossa cultura que, hoje em dia, é difícil que um "movimento" não seja automaticamente "hypado" e rotulado de fábrica ou esses mesmos já criam antes a própria etiqueta de identificação. É um jogo de trocas: ou a mídia cria e um grupo se assume dessa forma, ou os grupos surgem e a mídia reproduz. Foi assim com beatniks, hippies, mods, punks, góticos, skinheads, headbangers (metaleiros, para a Globo), glams, clubbers, grunges, indies, otakus, emos, from UK, e não poderia ter sido diferente com os corolidos.
Não, esse não é mais um blog falando sobre como os Cines e Restartes da vida, com seus visuais que podem ser vistos à olho nu da Lua, estão obrando na cabeça do rock de verdade. Apesar de não gostar nem um pouco de rock impúbere, com cheiro de tutti-frutti e banho tomado, darei um enfoque diferente, afinal, o óbvio é o pai do clichê, apesar do próprio clichê, hoje em dia, fugir do óbvio.
Primeiro gostaria de falar sobre a criação dos rótulos. Apesar dos exageros que surgem de vez em quando (como darkgrunge, como já escutei um ser humano se definir uma vez), acredito na importância da etiquetação das tribos urbanas (designação que odeio com todas as minhas forças) e dos produtos culturais como a forma "empírica" mais fácil de se entender e arquivar as tendências de uma época. O importante a destacar é que, quando se está no olho do furacão, não se é capaz de enxergar que esse mesmo rótulo já vem impresso com a data de vencimento de um "movimento". Dessa forma, comete-se excessos que poderiam ser evitados, já que, apesar do mundo estar mais volátil do que nunca, existem parcelas do processo que acreditam que tudo vai durar para sempre. Isso vale tanto para organizadores e produtores que investem todas as suas forças nesses modismos quanto para a adolescente que tatuou a letra de Garota Radical na nuca (caso surja, me avisem de imediato PELAMORDOPAI). Esse sistema é altamente perecível, precisa ser consumido rápido.
Já acreditar que essa é a pior moda rock dos últimos tempos desde que o homo sapiens sapiens inventou uma forma diferente de vestir suas peles é, no mínimo, falta de análise. A história do rock é feita sobretudo, de movimentos antagônicos que surgem completamente imersos na discriminação e na intolerância, se alimentando justamente disso para chamar atenção e estabelecer uma certa "vanguarda". Depois que esse processo é saturado pelo próprio sistema, surge outro, e outro, e outro, e outro...
Como exemplo disso, citarei um exemplo de vivência própria. Quando eu era pré-adolescente nos anos 90 (logo ali, onze anos atrás...) e ainda estava engatinhando na roqueirização, o pior xingamento que existia para um roqueiro era ser chamado de grunge. Já adolescente, o pior era ser chamado de newmetaleiro (fã de new metal). Depois, bem mais recente, era ser chamado de emo. Seguindo essa lógica, vejo que os corolidos são apenas o grupo da vez na berlinda roquenrrôulica (apesar de tudo, é considerado rock) e, quanto mais as críticas aumentam, mais cresce o poder de influência deles no cenário. Estamos bem no olho do furacão. Ou seria do arco-íris?
Apesar de tudo, está sendo interessante acompanhar mais uma tendência enquanto ela ainda está fresca e cheirando bem. Porém, proponho que o nome "coloridos" não deveria ser usado para falar dessa nova patota, já que é um termo de conotação já bem estabelecida (vide Pedro Bial, no BBB10). Sugiro algo mais jovialmente molecóide, que daria um tom mais lúdico, como "corolidos". Proponho também nomes anglófonos, que tenham uma boa relação metafórica com a tribo em questão e com a cultura de massa, como "M&Ms" ou "Faber Castells". Afinal, em inglês, colorido tem um significado bem diferente...
* - contração de hyperbole (hipérbole), o processo de massificação extrema de uma tendência da cultura de massa. O famoso "porque a rádio só toca Lady Gaga?"
14 comentários:
Vi uma reportagem que se referia à vertente como happy rock. Ainda não entendi bem o let motif dessa galera, mas me parece mais como se o Bob Esponja resolvesse tocar rock.
Enfim, vamos ver como mais esse "movimento" se desenvolve...
Bom texto!
Abraços!
Querido amigo Puppet. Pelo que vi ate agora, exemplo é esse video http://www.youtube.com/watch?v=OG2-HrXspOs
o nome coloridos cai bem
e eu acho uma P falta de sacanagem alguem dizer o contrario..
Tirando as brincadeiras.. eu só acho que assim que passou a epoca grunge, o rock perdeu sua veia politica e virou muito comercial. Talvez seja culpa do novo contexto do mercado musical, os produtores buscam algo que venda.
O pior é ver que calça aperta ovos cor de caneta marca texto e cortar o cabelo com o cabelereiro do chitãozinho e xororó vende...
Pois é, o pessoal do Restart se define dessa forma. Como se eles fossem o único "rock feliz" existente...
Enfim, isso está tão descontrolado que o lance do momento é se auto-rotular pra evitar as generalizações que eles, os diferentes que andam iguais, tanto temem...
ps: se os caras do Attack Attack! se definem de crabcore só porque tocam fazendo a dança do siri, vou inventar o puppetcore.
Só pra complementar meu comentario.. depois que eu vi acima
Já vi quem falasse que esse estilo é punk. Não gostei. Para mim, teve o punk, ai eles cansaram de ser politicos e por influência do mercado, veio o emocore, mas ae essa de se fazer de sofredor e corno já estava aproximando demais de sertanejo e brega. Então surgiu o RESTART. Nome sugistivo num é? para lançar moda e reciclar o emo?
Se for reparar nas letras, continua com a mesma proposta dos emos, porém, com acordes mais alegres que o transformaram nesse tal happy rock.
Mais uma vez a mão do produtor musical que quer lucrar.
Pois é, chamam de pop punk.
Nã adianta. Chega uma hora que o rock acaba sendo engolido pelo "sistema" pela sua própria forma de ser. A banda pode ser a mais xiita do planeta que, se acair na malha, já era. A revolta e a identidade foram empacotadas e estão na prateleira do supermercado. Ou se compra ou se morre de fome.
ps: seu comentário me lembrou o que um amigo me disse uma vez: "o emo é o filho gay do punk"
pois é...esse ciclo do rock, como todas as coisas, nasce, cresce, deixa herdeiros e morre.
não que sejam herdeiros necessariamente bons, acredito que todo movimento é bom, porém com seus bracinhos podres para sujar o nome da família.
muito interessante o texto.
abraço =)
acho q foi Van Morrison que disse "Cada geracao nova tem a OBRIGACAO de contestar a anterior" e, ainda que eu ache que, SIM, a coisa ta piorando, podemos dizer que esses jovens sao apenas fruto da epoca em que vivem. nao tiveram muita escolha, antigamente era dificil conseguir uma camisa, um disco, ir a um show... vc dava valor a isso, hj em dia esta tudo tao facil e banalizado que comecam a fuder com a porra toda.
voltando a primeira frase, pensemos bem, eles nao tinham muita escolha!! nossa geracao usou moicanos, patches, tatuagens, piercings, arrumou briga, falou palavrao, fez sexo casual, sexo grupal, fez muuuuito barulho, adorou o demonio... NADA q eles fizessem poderia chocar um cara da minha geracao! NADA?? pois eh.. aih eh que entram os emos e os coloridos. uma vez eu disse a um emo "entendo o fato de vcs serem UM BANDO DE VIADINHOS. eh a unica maneira de vcs chocarem a minha geracao...." pois eh. conseguiram de novo.
Hyperboles estão fazendo meu olho doer.
Bom, vamos nessa esperar a próxima geração do "rock".
Será que piora mais que isso ou o colorido é o limite e as coisas podem começar a ficar melhores?!
Esse clichê fugindo do obvio me deixa confusa.
E depois é muita cor pros meus cones processarem.
Me parecem que são boy-bands que vestem a roupa do que já se tem aceitação.
Não existe público alvo mais lucrativo que pré-adolescentes do sexo feminino.
adorei "rock feliz". ahahahahah
Comercialização e rock não são necessariamente contrários, e não apenas ideologicamente. Led Zeppelin nunca sofreu de grana, Cream não ficou pobre, Black Sabbath tinha seu quinhão, e os Ramones - lá em 76 - não iriam realmente dizer não a uma gravadora (os caras não tinham nem onde dormir, e lutar o capitalismo não apareceu um segundo no seu primeiro disco). Aliás, quase todos vivem muito bem obrigado. Acho que a questão não é realmente essa. Vai, pra mim, de encontro a outra instância. É pensar se o que estamos vendo é realmente fruto de uma geração, algo gerenciado e criado a partir destes jovens, ou apenas algo que caiu do céu publicitário. O punk, em sua forma embrionária, teve sua força por que vinha de uma cena, de pessoas que criaram algo por eles, para eles. Assim, o hardcore e o grunge de seattle. Daí, erroneamente chamar de "movimento" (parece que todo grupo de pessoas vira movimento do nada). Se é algo que se cria e reflete, nada contra. Posso não me identificar, mas porra, foda-se, é a vida. Agora, sendo apenas marketing e proveito, é triste, não tem força, não tem presença real, morre rapidinho que nem peixe fora d'agua. De todo modo, nao sou dos saudosistas. Essa geração tem é que colocar mais a cara pra fora. Se for isso, eu simplesmente não entendi ainda qual é.
opinião de alguém que deveria estar dormindo!
Eu juro que não consigo entender como alguém consegue ouvir essas bandas. É muito lixoso. Mas gosto é gosto, né? E quanto às roupas coloridas, nada mais nada menos do que uma releitura (ou cópia mesmo?) dos anos 80. Não muito diferente do que os emos dessa década fizeram ao chupar as referências visuais dos outros estilos musicais.
É a capitalismo de consumo galera. A palavra de ordem é consumir de forma irrestrita e acéfala.
Quanto mais artigos e peterotecos os ídolos da nova geração portarem, maiores são as possibilidades de lucro.
Abraa
ps: seu comentário me lembrou o que um amigo me disse uma vez: "o emo é o filho gay do punk"
Com a palavra, o autor da frase!
Gente, parece-me que os comentários tomaram um rumo diferente da discussão proposta por Puppet. Sua análise consiste na apropriação ou imposição de um rótulo. Qualidade musical e tendências estéticas que englobam este rótulo talvez sejam para um outro momento.
Nos últimos 3 anos eu tenho batido na mesma tecla: Zigmunt Baumann.
O seu conceito de modernidade líquida (Definição própria ao que muitos chamam de pós-modernidade) cai como uma luva para esclarecer o rápido (E curto) ciclo de vida que as coisas assumem em nossas vidas diariamente.
Só como exemplo: O tempo que eu levei para digitar este comentário foi suficiente para tornar um aparelho celular obsoleto.
Exagero?
Não.
Frutos de uma forma de viver (Consumir) que não soube se reinventar.
Fazemos parte disso.
Vivemos isso.
...e consumimos tudo (Ou quase tudo, pois gostos são indiscutíveis)!
Puppet, belíssimo texto.
Como "apêndice" de sua retrospectiva do que é ser um mal roqueiro, sugiro visitar o portal Whiplash, e buscar a história do rock. O referido texto se encerra com uma crítica ácida ao New Metal.
Agora preciso ir, depois de tanto falar em cores, não sei se ouço "Aquarela do Brasil", de Ary Barroso, ou "Aquarela", de Toquinho.
Muito bom texto!! Parabéns! O problema maior que vejo nos movimentos do underground é o policiamento ideológico. Cada um é livre para escutar o que quiser nesta vida, por exemplo. Tenho um blog punk, com bandas punk e estou lendo e ouvindo Billye Holiday, no momento. E ninguém pode me impedir de fazer algo orgânico.
Um abraço.
Sandro Neiva
www.pervitinfilmes.blogspot.com
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