aquela porção pouca de dezenas de garotos e garotas ocupavam a calçada por inteiro, fazendo dela seu feudo moderno, distante do poder severo do castelo repressor, enchido de mestres, zeladores, orientadores e afins.
eram os reis da longevidade descontínua, temporária (tropeçando em camus), a esperança que ainda não era resignação , mas que não tardaria a mutar.
cheiravam à fast-food, bermudas tac-tel, libido desenfreado, aço cirúrgico, plástico de bonés, com logos que marcavam a importancia hierárquica de cada um dentro do bando.
cheiravam à fast-food, bermudas tac-tel, libido desenfreado, aço cirúrgico, plástico de bonés, com logos que marcavam a importancia hierárquica de cada um dentro do bando.
escutavam música, todas na mesma sintonia, na mesma onda e batida. muitos usavam fones em um só ouvido, de modo que pudessem manter o link social, ao mesmo tempo que criavam um videoclip nas suas cabeças.
assim, se formava um zumbido de mil vozes, que somadas nao eram uma, e o barulho surpreendia, quando se atentava ao que era ouvido:
o vazio, as lacunas de personalidades de frases e idéias incompletas mas sinceras, dentro da ignorância abençoada. as opiniões que um dia (quando revisitadas numa retrospectiva inocente, numa festa de reencontro ocasional, ou um churrasco um pouco mais carregado dessa energia sentimental, imensa e desconexa, que o álcool consegue causar) seriam motivo de vergonha.
jovens soldados acovardados e sanguinários, que defendiam uma pátria-menor que nunca existiu e nunca existirá. lutavam, procurando um lugar para ser seu.
se chocavam, uns com os outros, nos olhares, nos cantos de boca. uma guerra cessante e inocente que eclodiria mais tarde, na vida, na guerra perene, dolorida, do passar dos anos.
a frivolidade era a linha no tecido que unia aquelas camisas, bermudas, calças, saias, balangandans da moda, bordada pelo sol de fim de tarde e sua energia vermelha visível à poucos olhos nus, pela lanchonete lotada e os sachês de mostarda sendo transformados em artilharia aérea.
eram poucos os feridos ocasionais. mas era certo: havia o desejo de ser atingido por essa energia, embora a negação os obrigasse a ser mais civilizados.
e nos ônibus, carros e motos, os jovens idosos que voltavam pra suas casas, depois do trabalho desagradável, a labuta insossa e sem muitos resultados, pousavam os olhos naquela porção de pessoas, sentiam o estômago arder de inveja não-declarada, que nunca será assumida, trocando de nome, cada vez que uma crítica nova à esses novos jovens é feita.
vagabundos, perdidos, transviados, vandalos, punks, drogados, degenerados. rebeldes com ou sem causa, cada caso é um caso, cada um do seu modo, se mesclando à cena local-mundial, entrando em conflito com as gerações anteriores.
pousavam os olhos, na verdade, numa paisagem que já fizeram parte, já pertenceram, e hoje passam a vista, fazem vista grossa, grunem no banco duro para não explodir de dentro pra fora.
eles vão continuar lá.
na chuva, no sol, na sombra da amendoeira da frente, testemunha visceral involuntária desses ciclos e que nesse amontoado de relações, é ela, esta árvore, a única que se mantem estável, inatingível, firme, servindo a anos para encontros amorosos e algumas mijadas ocasionais.
outras gerações virão, ocuparão essas calçadas e sempre serão mal-vistas.
é a covardia da juventude. muita retórica pejorativa e críticas infundadas, pra esconder o óbvio:
não há maneira de competir com isso.
só aguardar a próxima, e a próxima, e a próxima, e esperar que esse monstro que vive interno, não jante de uma vez só. que demore alguns anos, pois ele precisa se alimentar pra se manter vivo, pra aguentar o tranco do resto dos dias, que virão.
e assim, a frivolidade, a superficialidade acabam sendo uma benção.
uma benção que tem data e hora certa pra finalizar seus serviços.
pura maldade.
4 comentários:
Gostei mto de tudo isso!
Mande um beijo pro Puppet!
Até!
Um realista e puro exemplo de Sarjetocracia.
É a sarjeta como Estado.
uhn... :)
Nossa, fiquei triste após ler isso.
Tão real...
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